O Projeto de Lei (PL) 3.729/2004, que institui a nova Lei Geral de Licenciamento Ambiental, aprovado na Câmara dos Deputados na última quinta-feira, 13, é inconstitucional e traz uma série de retrocessos ao País. Essa é a opinião de Cristina Seixas Graça, promotora de Justiça da Bahia, presidente da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza. “Infelizmente, é mais um passo no desmonte das estruturas de controle social e proteção ao meio ambiente no Brasil”, afirma.
Aprovado por 300 votos a 122, o texto-base do PL teve todos os destaques rejeitados na Câmara e foi encaminhado para análise do Senado. O projeto já recebeu críticas de diversas organizações da sociedade civil e, inclusive, motivou nove ex-ministros do Meio Ambiente, de diferentes partidos, manifestarem “forte apreensão e rejeição” à proposta.
Ao contrário do que argumentam muitos defensores da flexibilização no licenciamento, a promotora acredita que a proposta deve trazer insegurança jurídica, pois o PL fere a Constituição Federal.
“O artigo 170 da Constituição, inciso 6º, determina que a defesa do meio ambiente é um dos princípios que devem guiar a organização da ordem econômica”, comenta. “Em relação ao artigo 225, que impõe ao poder público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente, esse projeto é uma verdadeira afronta”, enfatiza a promotora.
Para Cristina Seixas Graça, toda a sociedade deve ficar preocupada com a mudança aprovada na Câmara. “A proposta enfraquece o controle sobre atividades econômicas que podem gerar riscos imediatos, colocando em perigo as gerações atuais e futuras. Infelizmente, com menos controle e fiscalização poderemos ter novos ‘acidentes’ como os de Mariana e de Brumadinho”, alerta. Ela ressalta que ainda analisará os detalhes da proposta, mas em linhas gerais o novo marco legal é um retrocesso.
A promotora entende que o projeto aprovado na Câmara choca-se com a noção de desenvolvimento sustentável e pode trazer, inclusive, constrangimentos diplomáticos ao Brasil, já que o país é signatário de tratados internacionais, como o Acordo de Paris. “Enquanto o mundo está preocupado com as mudanças climáticas, comprometido com a redução de emissões de gases de efeito estufa, e as empresas conscientes buscam implementar políticas de ESG (Environmental, Social and Governance), o nosso Congresso ainda se guia por um falso dilema entre crescimento econômico e proteção ao meio ambiente”, analisa Cristina.
O PL dispensa do licenciamento ambiental uma série de atividades agropecuárias e projetos de manutenção em estradas e portos, obras de saneamento básico, projetos de distribuição de energia com baixa tensão, entre outros. “Causa-nos espanto a aprovação desta mudança na legislação sem ouvir a sociedade, os cientistas e especialistas, sem a realização de audiências públicas para que haja um amplo debate sobre a matéria”, pontua Cristina.
Para a especialista, a flexibilização do licenciamento pode gerar uma espécie de “guerra ambiental” entre os Estados, a exemplo da “guerra fiscal”, que busca atrair investimentos por meio da renúncia de impostos e tributos. “Os Estados que forem mais ‘flexíveis’ poderão se tornar mais atraentes para quem busca lucros imediatos e não tem compromisso com um meio ambiente saudável”, reflete a especialista.