A Noruega explora petróleo e caça baleias, é verdade. Mas, ao mesmo tempo, opera uma agenda sólida e profundamente conectada com Ciência e com as principais tendências do capitalismo moderno. Nestes, os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) pautam cada vez mais os mercados, desde o financeiro ao varejo da alimentação. Os noruegueses reservam para usufruto das gerações futuras 40% do fundo de 10.9 trilhões de dólares (https://www.nbim.no/) criado com recursos do petróleo. Para enfrentar a deterioração dos estoques de bacalhau, a Noruega – o País preferencial das empresas ESG (Environmental, Social and Governance ) – criou a “Cod Academy”, um programa de gestão integrada do conhecimento reunindo governo, universidades e iniciativa privada. Em poucos anos, o peixe sustentável do Mar Báltico tornou-se uma grife, uma narrativa que chancela a responsabilidade social e ambiental dos países produtores.
A Agricultura Tropical Sustentável, construída sobre uma Plataforma de Ciência, Tecnologia e Inovação, é provavelmente a maior e mais relevante contribuição já feita pelo Brasil ao processo civilizatório da humanidade. Barateou e democratizou o alimento, transformou um dos biomas mais naturalmente degradados do Planeta – os Cerrados – num celeiro global. Funcionou como escudo protetor de uma Amazônia que estava sendo ocupada antes do conhecimento científico chegar. Revolucionou a saúde, os padrões de longevidade, criou bem-estar, civilização e dezenas de cidades naquilo que há pouco mais de 40 anos era o Brasil profundo, abandonado e deserto.
Não obstante, em quase cinco décadas de conquistas substantivas para o Brasil e para o mundo, o Agro brasileiro continua a não fazer parte do projeto brasileiro de sociedade e a ser percebido como uma ameaça ambiental e à saúde dos consumidores pelos formadores da opinião pública, aqui e no plano internacional.
É preciso ter a coragem de mudar, desenvolver uma narrativa compatível com a excelência da Plataforma de Ciência, Tecnologia e Inovação que sustenta os pilares da Agricultura Tropical Sustentável.
O tempo urge. Temos à disposição uma legião de jovens urbanos, inovadores, ansiosos por uma causa para investir a sua energia criativa na construção de um mundo melhor.
E, existe causa mais nobre do que superar o déficit alimentar, tanto o hoje existente quanto nas próximas décadas; contribuir decisivamente para a redução da desigualdade, para a inclusão social e tecnológica dos povos tropicais; para a contenção das migrações forçadas?
E se essa narrativa vier alinhada com as mais evidentes tendências do capitalismo contemporâneo?
É nesse sentido que a candidatura do Professor Alysson Paolinelli, Presidente do Fórum do Futuro, ao Prêmio Nobel da Paz, pode se transformar num divisor de águas. Sugerida e provocada pela visão política e estratégica do também Conselheiro e ex-ministro da agricultura, Roberto Rodrigues, a candidatura tem na sua base uma contundente narrativa: tudo o que foi feito no Brasil decorreu de um trabalho em Rede, orientado por Ciência, Tecnologia e Inovação; todas as transformações que poderemos desenvolver doravante podem igualmente ter origem numa Plataforma do Conhecimento voltada para o desenvolvimento sustentável, tendo como ponto de partida a identificação dos limites de uso de cada um dos nossos biomas.
Inúmeros sinais de que a sustentabilidade associada à transparência e à ética se consolidam como vetores de uma das mais consistentes tendências econômicas das próximas décadas.
O Conselheiro do Fórum do Futuro e ex-Ministro do Planejamento, Paulo Haddad, acredita que a narrativa já se tornou uma poderosa arma econômica de grande impacto, capaz de dirigir investimentos globais. Ele traz para esse debate o livro (2019) do Prêmio Nobel de Economia, Robert Shiller, que aborda um dos aspectos mais relevantes para a compreensão desse conceito: “Narrative Economics – How Stories Go Viral and Drive Major Economic Events”.
Esses sinais cada vez mais fortes nos levam a crer que a Comunicação, o formato e as mensagens com os quais a Ciência e os negócios compõem seu diálogo com as sociedades, são elementos estruturantes dessa questão. A Comunicação é um dos pilares do problema e da solução, mas está longe está longe de ser o único.
Em jogo estão a reputação dos produtos brasileiros, a qualidade da inserção no mercado internacional, a oportunidade de novos investimentos, a perda de cérebros, ou em última análise o futuro do País. Já estamos pagando um alto preço por nos afastarmos da coligação das Nações com a bússola virada para o capitalismo avançado.
Custo este que só vai aumentar…
Alguns exemplos desse admirável mundo novo:
1) ESG -Considerado o “Pai da ESG” (Environmental, Social and Governance), John Elkington, foi um dos precursores dessa visão nas grandes empresas. Para ele, os investidores estão dispostos a “pagar muito” para ter acesso aos recursos da Amazônia. Ou, na leitura de outro destacado Conselheiro do Fórum, o pesquisador José Oswaldo Siqueira, “a Amazônia pode se transformar na maior fonte de produtos orgânicos do Planeta”.
Dezenas de modelos ESG estão sendo construídos em impressionante velocidade, especialmente no mercado financeiro. No Brasil, e fora:
https://conteudos.xpi.com.br/esg/
https://corporatefinanceinstitute.com/resources/knowledge/other/esg-environmental-social-governance/
https://www.bloomberg.com/professional/solution/sustainable-finance
2)Capitalismo Consciente – Produto da parceria entre o acadêmico indiano Raj Sisodia e o fundador do “Whole Foods”, John Mackey, no livro “Empresas Humanizadas: Pessoas, Propósito e Performance”. O “Whole Foods começou com uma loja, em 1978, em Austin, no Texas. E, um conceito ergueu um império: “vender o melhor alimento possível”. A operação, hoje em 16 países e com 500 pontos de venda nos EUA, foi comprada pela Amazon, em 2017, por US$ 13,7 bi.
Quando o Whole Foods prestigia produtos locais dialoga diretamente com a proposta do Professor Paolinelli que defende a inclusão dos 4,5 milhões de produtores não tecnificados pela via desse “mercado verde”.
3)Pesquisa Responsável, Gestão e Negócios – https://www.rrbm.network/
Os cientistas reunidos na RBBM imaginam um mundo governado pela colaboração entre diferentes parceiros, aí considerando o setor empresarial e seu interesse em impulsionar empresas de base tecnológica. Para os pesquisadores da Rede, “o sistema atual está aquém de cumprir nosso potencial coletivo”. E, nessa ótica, as instituições precisam aferir e acompanhar a qualidade do seu impacto sobre os negócios e a sociedade. Percebem onde Ciência, Governo e Iniciativa Privada inserem os resultados da pesquisa numa plataforma de diagnóstico comum, o resultado constrói uma visão estratégica sólida e consequente.
4)A Universidade do Bacalhau (Cod Academy)
(https://cod.fromnorway.com/sustainability/
Fundada no tripé formado pelas perspectivas do Planeta, das Pessoas e do Lucro, essa iniciativa partiu da constatação, em 2011, da ameaçadora degradação dos estoques de bacalhau na costa norueguesa. Na prática, os biólogos identificaram os limites sustentáveis da pesca, o governo fortaleceu a regulação, a Marinha foi convocada para a fiscalização, os economistas perceberam que a comercialização de bacalhau era limitada porque fortemente sazonal (Páscoa e Natal). E os Chefs foram instados a criar receitas para tornar a iguaria um prato do dia a dia.
Assim nasceu a Rede Nórdica a Recirculação de Sistemas de Aquacultura – https://www.nordicras.net/ -, hoje reunindo dezenas de doutores, gestores e economistas dos países em torno do Mar Báltico.
Em suma, o conjunto dessas tendências configura principalmente um movimento do capital na direção da modernização do processo produtivo. Provavelmente, um novo salto do capitalismo em busca da sobrevivência.